"O Ódio que Semeias" | Review

janeiro 08, 2021

Foi a meio de maio, sensivelmente, que fomos abalados com a notícia e com as imagens perturbadoras da morte de George Floyd por um polícia americano. Foi a meio de maio que os protestos se tornaram mais fortes, que o racismo voltou a ser tema de conversa (e que deverá sempre sê-lo enquanto for um problema da nossa sociedade), que conhecemos a história de muitos outros e outras "George Floyd's" deste mundo. E foi também nessa altura que eu conheci o livro de que hoje vos venho falar, porque li vários posts de diferentes pessoas a falarem sobre ele, sobre como ele era importante e especialmente pertinente para a época em que vivemos.


Vários meses depois, decidi comprá-lo e dedicar-me à leitura de O Ódio que Semeias, de Angie Thomas. Este livro conta-nos a história de Starr, uma adolescente de 16 anos, que "vive" entre dois mundos: o seu bairro problemático, habitado por negros como ela, e a escola que frequenta, numa zona elegante residencial de brancos. Starr tenta equilibrar estas duas realidades ao ser versões diferentes de si mesma consoante o local onde está, contudo esse equilíbrio é perdido quando se torna a única testemunha do assassinato de Khalil, o seu melhor amigo, por um polícia. É a partir desse momento que a vida de Starr e da sua família mudam, pois tudo o que ela disser sobre o crime que presenciou pode ser usado a seu favor ou contra si, levando a que Starr tenha de passar por uma grande tormenta e tomar algumas decisões difíceis


É difícil, para mim, exprimir o que senti ao ler este livro, porque foi uma grande mistura de emoções e sensações. A cada página do livro, eu me apercebia mais e mais do que é o privilégio branco e da sorte que tenho. As provações pelas quais a Starr tem de passar porque assistiu a um polícia matar o seu melhor amigo negro, o medo que ela sente por ter de testemunhar contra alguém que, à partida, está logo em vantagem e o sofrimento que ela passa por ter assistido à morte do seu melhor amigo e por saber que, infelizmente, a justiça não ficará do lado dele... São tudo coisas que doem ao ler, mas que eu sei que, provavelmente, nunca irei na passar na minha vida e isso "custa a engolir", de alguma forma. Imaginar que alguém, noutro ponto do mundo ou mesmo no meu país, da minha idade, parecida comigo em todos os aspetos exceto na cor de pele, pode ter de passar por algo tão assustador quanto aquilo que lemos neste livro.


Para mim, este livro tem uma mensagem realmente muito forte e devia ser de leitura obrigatória, porque nos obriga a refletir sobre coisas que, no dia-a-dia, muitas vezes escolhemos ignorar ou que nos passam ao lado. E é fundamental percebermos realmente que o ódio que semeamos, que destilamos uns com os outros, tem um impacto gigante nas gerações mais novas que assistem a ele, pois começam a encará-lo como algo "normal" e a reagir a ele como veem as outras pessoas reagirem. É preciso, cada vez mais, educar as crianças e ensiná-las o que está certo, o que está errado, não lhes incutir os preconceitos racistas, desfazer estereótipos... Precisamos de lhes dar o exemplo, de lhes incutir os valores certos, porque ninguém nasce racista ou xenófobo ou preconceituoso, apenas aprendem a ser assim através daqueles que os rodeiam. E precisamos igualmente de educar as gerações mais velhas de que as ideias delas não estão sempre corretas e de que não é por ser negro, cigano, ucraniano ou o que quer que seja que são menos dignos de respeito do que os "brancos". 




Esta é uma das minhas citações favoritas do livro, porque se aplica às duas faces da moeda: aplica-se às pessoas que sentem na pele a discriminação, para que não se calem, para que não se permitam ser espezinhadas, para que usem as suas vozes para mudar o rumo da história; e aplica-se também a todos nós, os brancos privilegiados, que, mesmo não sendo os racistas ou os que discriminam, perpetuamos esta discriminação e este racismo ao ficarmos calados, por isso também nós temos de usar a nossa voz para denunciarmos quando virmos algo de errado a acontecer, para educarmos os outros, para desconstruirmos preconceitos e estereótipos, para repreendermos os nossos amigos/familiares quando têm uma atitude racista. Temos de ser todos parte da mudança, da construção de um mundo mais justo e onde haja mais equidade


Acho que, depois de tudo isto, é escusado dizer que foi um dos livros que marcou o meu ano de 2020 e ascendeu para o top dos favoritos, sem sombra de dúvidas. Espero que tenham gostado deste post e, se já leram este livro, gostava de saber as vossas opiniões.


Para terminar, falando só muito brevemente em relação à adaptação cinematográfica deste livro, eu compreendo que nunca é possível ser-se 100% fiel ao livro e que há sempre cenas que têm de ser cortadas, por isso a linha geral da história foi mantida. Contudo, há tantas coisas importantes neste livro que foram cortadas do filme ou alteradas no filme e isso deixa-me um bocadinho triste, porque quem só vir o filme não vai ter a verdadeira noção da história. Por isso, se só viram o filme, convido-vos a ler o livro, porque vale realmente a pena!



7 comentários:

  1. Ainda não li o livro e fiquei com uma enorme vontade de o ler. Gosto muito desse tipo de livros, que nos desafiam a vestir a pele do outro, no sentido mais lato. Obrigada pela partilha!

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  2. Não li o livro, mas, tal como o racismo, existem outras problemáticas que passam "ao lado" de muitas pessoas e que "preferimos ignorar". Obrigado por esta review e por deixares a tua opinião.
    Beijinhos.

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  3. Muito obrigada pela partilha, não conhecia, mas fiquei super interessada, devemos sempre abrir mentes e corações! <3

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  4. Obrigado pela partilha. Não conheciamos esse livro mas ficamos com muita vontade de ler.

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