"Pão de Açúcar" | Review
"Em Fevereiro de 2006, os Bombeiros Sapadores do Porto resgataram do poço de um prédio abandonado um corpo com marcas de agressões e nu da cintura para baixo. A vítima, que estava doente e se refugiara naquela cave, fora espancada ao longo de vários dias por um grupo de adolescentes, alguns dos quais tinham apenas doze anos.
Rafa encontrara o local numa das suas habituais investidas às zonas sujas, e aquela espécie de barraca despertou-lhe imediatamente o interesse. Depois, dividido entre a atração e a repulsa, perguntou-se se deveria guardar o segredo só para si ou partilhá-lo com os amigos. Mas que valor tem um tesouro que não pode ser mostrado?"
Esta é a sinopse de Pão de Açúcar, o livro de Afonso Reis Cabral que nos leva a descobrir a história dos dias que antecederam à morte de Gisberta Salce Júnior. A primeira vez que ouvi este nome foi quando Pedro Abrunhosa lançou a sua Balada de Gisberta e depois fui descobrir quem era a Gisberta e qual a sua história. Chocou-me de tal maneira que nunca mais esqueci este nome. Há uns anos, provavelmente quando ganhou o Prémio Saramago, ouvi falar deste livro e fiquei com imensa vontade de o ler. Quando abri o embrulho do livro do mês de outubro, oferecido pela minha irmã, fiquei muito feliz ao encontrar este livro - sabia que não seria uma leitura fácil, mas queria muito lê-lo.
Este livro é um murro no estômago. Uma história que deixa um aperto no peito, um nó na garganta. Acabei esta leitura um bocadinho sem chão - mesmo sabendo o desfecho da história. Acho que, acima de tudo, este livro nos confronta com circunstâncias de vida muito duras, de parte a parte, que nos fazem questionar se efetivamente existem pessoas puramente boas ou más ou se somos meramente o resultado do ambiente em que crescemos. Em Rafa, temos uma criança que nunca realmente o pôde ser e que, em certos momentos, nos deixa na dúvida se sentimos pena ou raiva.
Apesar de não ter adorado a escrita do livro, o que me fez custar um bocadinho a entrar na leitura, sinto que este é um livro mesmo importante, que conta uma parte da nossa história enquanto sociedade, desta transfobia/homofobia que está escondida e enraizada, ainda hoje, por aí e que se vai manifestando das piores formas. Esta história, por ser real, faz-me ter vergonha de nós enquanto sociedade, porque Portugal falhou à Gisberta e falhou também àqueles miúdos, porque os colocou ao cuidado, supostamente, de pessoas que deviam educá-los e dar-lhes uma vida melhor, mas que os trataram mal, abusaram deles e não lhes deram as devidas oportunidades para que pudessem ter um futuro. Não digo que eles não sejam culpados e que não sejam "vilões" nesta história, mas acredito que, por vezes, os vilões podem ser vítimas ao mesmo tempo - e acho que o Rafa é o exemplo disso.
Recomendo muito esta leitura, mesmo que ainda não conheçam a história da Gisberta. É uma leitura importante e que vale a pena para nos fazer refletir.
Conheço, mas nunca me puxou para o ler.
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