"999 - A História Extraordinária das Mulheres do Primeiro Transporte Oficial para Auschwitz"

Em 999 - A História Extraordinária das Mulheres do Primeiro Transporte Oficial para Auschwitz, Heather Dune Macadam apresenta-nos a história nunca antes contada de algumas figuras mais ocultas da II Guerra Mundial e a tragédia comovente que as une. É uma história verídica, de amizade e sobrevivência, das primeiras 999 mulheres enviadas para o campo de concentração de Auschwitz.

A 25 de março de 1942, cerca de 1000 jovens judias solteiras subiram a bordo de um comboio em Poprad, na Eslováquia, imbuídas de um sentido de aventura, dever e orgulho nacional. Deixavam a casa dos pais, vestiam as suas melhores roupas e acenavam confiantes, acreditando que iam trabalhar numa fábrica durante alguns meses, ao serviço do governo. Em vez disso, estas jovens - muitas delas adolescentes - foram enviadas para Auschwitz, como escravas. Destas 999 deportadas, muito poucas sobreviveriam para contar a sua história. 

Os factos relacionados com o primeiro transporte oficial de judeus para Auschwitz são pouco conhecidos, mas não deixam de ser profundamente relevantes nos dias de hoje. Não estamos perante guerrilheiros da resistência ou prisioneiros de guerra. Não havia um só homem neste transporte. Enviadas para uma morte quase certa, as jovens eram impotentes e insignificantes, não só por serem judias, mas também por serem mulheres. É também por isso que Heather Dune Macadam revela as suas histórias comoventes, através de extensas entrevistas com as sobreviventes, consulta com historiadores e testemunhas e familiares das primeiras deportadas, para que a história destas mulheres não fique esquecida.

 

Atualmente, há muita literatura sobre o Holocausto. Há livros de ficção que têm por base histórias reais, há vários livros de história sobre o tema, entrevistas, reportagens, documentários, filmes... Há muita informação e, talvez por isso, caiamos no erro de achar que sabemos tudo. Bem, se houve algo que aprendi com este livro, foi que há muito que não sabemos sobre o que se passou nos campos de concentração, nomeadamente de Auschwitz-Birkenau, e que há também muito que provavelmente nunca saberemos, porque não estão cá pessoas para o contar. E aproximamo-nos de uma era em que deixarão de haver sobreviventes vivos para nos contar a história na primeira pessoa. Por isso, estes testemunhos reais, com histórias contadas por sobreviventes, são fundamentais e são uma peça essencial do puzzle para podermos ter uma ideia do que realmente aconteceu.

 

E quando começamos a ter uma noção das atrocidades cometidas naquele lugar... É desolador. Para mim, foi, pelo menos. Enquanto mulher, jovem, ler o que aquelas mulheres passaram durante 3 anos naquele campo é assustador, agoniante. Muitas delas não sobreviveram, mas as que sobreviveram tiveram de testemunhar a morte de companheiras de viagem, amigas de infância, familiares e de voltar para casa com todas aquelas memórias, as marcas deixadas nos corpos e voltar para casas vazias (de pessoas e bens materiais) e, muitas vezes, completamente destruídas. É absolutamente horrível. 

 

Ler os testemunhos destas mulheres e também dos seus familiares fez-me sentir uma impotência tão grande e uma raiva ainda maior. Como é possível o mundo ter permitido que aquelas pessoas fossem tratadas assim? Os tempos eram outros e tendemos achar que um cenário assim jamais se repetirá, mas... Será tão impossível assim? Espero que seja impossível, porque jamais alguém deveria ser submetido ao que aquelas mulheres - e todas as pessoas que foram deportadas para os campos de concentração - viveram. As condições deploráveis, a falta de alimento, a falta de condições básicas de higiene, os trabalhos forçados e sem qualquer tipo de condições, a ameaça constante à vida... Ninguém merece viver algo assim e quase se torna fácil para mim perceber por que motivo algumas delas, em diversos momentos, preferiam morrer a continuar naquele tormento.

 

A História tem muito ainda para nos ensinar e acho que este tipo de livros são absolutamente fundamentais e que deveriam ser obrigatórios de ler na escola - em troca de outras coisas que os miúdos são obrigados a ler. Só o conhecimento consegue lutar contra governos extremistas e totalitaristas, porque é uma arma muito poderosa - e, nos tempos que vivemos, acho crucial que aprendamos mais, até porque se costuma dizer que a História é cíclica. Por isso, já sabem, fica aqui a minha recomendação a todos para lerem este livro - com o disclaimer de que há descrições um bocadinho mais fortes, que podem impressionar os mais sensíveis.