Divagações sobre não sermos polvos

novembro 27, 2023

Sabem aquela sensação de querermos fazer tudo e mais alguma coisa, de termos uma lista de coisas para fazer e planos marcadas, mas sentirmos que não somos capazes? Pois, essa sensação tem-me atormentado um bocadinho ultimamente. Não que tenha propriamente um motivo específico de base, mas estas últimas semanas até ao final do ano vão ser preenchidas, tenho várias coisas planeadas, algumas das quais me vão fazer sair da minha zona de conforto... E isso tem-me deixado um bocadinho ansiosa porque fico meio "obcecada" com que tudo corra bem, com ser capaz de fazer tudo e fazer tudo bem. Quero planear e organizar tudo atempadamente, programar tudo bem direitinho, quase cronometrado ao segundo para garantir que não falta nada e que consigo fazer tudo, e, no meio disto tudo, ainda fico a pensar sobre as despesas que algumas dessas coisas implicam e por isso preocupo-me sobre como fazer tudo sem ir à falência (isto é a minha veia forreta a falar mais alto). Resumidamente, eu quero fazer tudo e sei que, no fundo, até consigo, mas quero ser capaz de ter controlo sobre tudo, planear tudo antecipadamente para que nada falhe e a verdade é que isso não é possível (pelo menos a 100%), porque nem tudo está sob o meu controlo e isso deixa-me um bocadinho louca - não fosse eu uma control freak.


Bem, tudo isto que me tem preocupado, lembrou-me de uma altura da minha vida em que eu me senti um bocadinho assim. Era uma fase da minha vida diferente, em que tinha prioridades e objetivos diferentes, mas em que também tinha "muita coisa no meu prato" e isso levou-me a um estado de cansaço a nível físico, mas sobretudo mental. Estou muito longe de estar novamente nesse ponto, até porque as situações são bem diferentes, mas recordar-me disso lembrou-me que não é suposto eu permitir que tal coisa volte a acontecer. Que não é suposto sentirmo-nos sobrecarregados ao ponto de sentirmos que não conseguimos respirar bem ou que o nosso corpo não consegue responder às exigências que lhe impomos ou que vamos começar a chorar a cada segundo que passa. Não acho que tenha sido um burnout (na altura, antes da pandemia, nem se falava nesse termo), mas foi uma altura da minha vida em que eu tinha muita coisa a acontecer ao mesmo tempo, em que eu queria conseguir chegar a todo o lado e fazer tudo perfeitinho, sem falhar com nada nem ninguém e isso levou-me a comprometer, em certa medida, a minha saúde mental. Nessa altura, esqueci-me que não sou um polvo - tenho só dois braços e duas pernas e não dá para fazer tudo ao mesmo tempo, por mais que me esforce muito. 


Felizmente, consegui chegar sozinha a essa conclusão e isso fez-me parar para pensar em várias coisas, pesar as diferentes coisas que estavam a acontecer na minha vida, estabelecer prioridades e perceber que, por vezes, temos de fazer escolhas na nossa vida - escolhas essas que nem sempre são fáceis, que nos podem deixar tristes no momento, mas que, a longo prazo, se vão revelar o melhor para nós. Foi isso que eu fiz: uma escolha difícil entre duas coisas muito importantes para mim, mas que uma delas teve de ficar para trás. Mais do que outra coisa, escolhi o meu bem-estar.


A verdade é que é muito fácil deixarmos que o ritmo frenético a que vivemos (e a que nos é impingido que vivamos) nos consuma, porque vivemos numa época em que parece que nos sentimos obrigados a estar sempre a fazer mil e uma coisas em simultâneo, a mostrar que somos ótimos em tudo o que fazemos, em que se romantiza o trabalhar sem horários para alcançar os nossos objetivos e ter uma vida preenchidíssima em que mal há tempo para dormir. A questão é que nada disso é realista. Não temos de (nem podemos) ser perfeitos em tudo, não temos de nos meter em trinta mil coisas diferentes só porque os outros o fazem e para mostrar que também conseguimos, mesmo que isso vá prejudicar a nossa saúde mental. Eu sinto que as redes sociais têm contribuído muito para que aumentemos esta pressão sobre nós próprios, para que nos sintamos inferiores se não formos capazes de ter mil projetos diferentes, mas também é preciso sabermos quais são os nossos limites e aprendermos a respeitá-los, porque primeiro estamos nós próprios, sempre. E está tudo bem em só conseguirmos lidar com uma coisa de cada vez. Está tudo bem em priorizarmos o que é mais importante para nós, neste momento, e deixar o resto para mais tarde. Mais importante do que ter mil projetos, é sabermos quando parar e investir no projeto mais importantes: nós próprios.


Não somos polvos. Não temos oito braços. Não temos de lidar com mais do que aquilo que suportamos. Temos de nos respeitar, aos nossos limites. Temos de ouvir o nosso corpo, as nossas necessidades. E temos de perceber que todos somos diferentes e, por isso mesmo, as comparações só nos prejudicam. E lembrem-se que aquilo que vemos nas redes sociais é só aquilo que as pessoas nos querem mostrar, por isso talvez esteja na altura de darmos menos valor a tudo isso e mais valor a nós mesmos.


1 comentário:

  1. Se bem que às vezes dava jeito ter 8 braços. Ainda assim, não nos podemos permitir ser novamente sugados e consumidos porque queremos fazer tudo ou porque assim nos exigem.

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